Hoje faz 80 anos que o Plínio Marcos nasceu. Visceral, risonho, e inquieto. Escrevia para incomodar! Para nos despertar. Sem luxo, sem firulas ou rodeios. Era direto, seco e jornalístico.
Eu o conheci quando ainda era adolescente. Ele foi na minha escola, apresentar “Quando as máquinas param”, um dos seus vários sucessos. Ao final, realizou um debate conosco. Me lembro que ri muito, e chorei. Ele fez o que queria com a nossa emoção. Tinha domínio sobre o público. Me emocionei com aquele baixinho invocado, desbocado e carismático.
No final ele nos disse: - Se eu conseguir sair daqui, hoje, tendo subvertido algum de vocês, já terei cumprido minha missão!
Saí subvertido! Aquela inquietação bateu em mim, me identifiquei.
Pouco depois, por diversas razões, e inspirado também por outras pessoas, comecei a estudar teatro. Comecei a frequentar a livraria do INACEN, que funcionava no Teatro de Arena. Cansei de encontrá-lo por lá. A Beth, que atendia a livraria, guardava sempre as coisas dele.
Nós também nos encontrávamos, vez ou outra, na porta dos teatros, onde ele vendia seus livros, e vinha sempre com o mesmo argumento:
- Compra meu livro que eu te dou um autógrafo, e prometo morrer logo, para valorizar.
- Plínio, tu autografa todos os teus livros. Daqui a pouco, raridade será ter um livro teu que não tenha autógrafo!
Ele, que era rápido de raciocínio, rebateu “na lata”: - Sabe que tu tens razão! Vou passar a cobrar mais pelos livros sem autógrafo.
Em 1985, teve o projeto "Balanço Geral", no Teatro Maria Della Costa, onde foram feitas leituras dramáticas dos principais espetáculos censurados nas últimas décadas. Após as leituras, eram feitos debates e, quando possível, reuniam o elenco original, para dar seu depoimento sobre esta época, em que a censura era ferrenha e atacava o teatro com tudo.
Fui em quase todas essas leituras e, no dia em que leram a "Feira Paulista de Opinião", que apresentava algumas peças curtas dos autores mais polêmicos da época, eu estava na plateia. Uma das peças apresentadas era do Plínio, e ele colocou um gorila, em cena, vestido de militar. Essa cena foi muito comentada durante o debate. Me lembro que, no instante em que o ator Renato Consorte (que havia interpretado o gorila) estava dando o seu depoimento, alguém chegou com a notícia de que o Plínio tinha sofrido um enfarte. O teatro, imediatamente, esvaziou. Todos, preocupados, foram para o hospital, prestar sua solidariedade à família, e ajudar como podiam. Plínio era muito querido por todos. A classe teatral o amava e admirava. E as preces dos amigos foram atendidas. Ele escapou desta.
Em 1999, ele se foi. Me lembro que, nesta época, estava trabalhando como executivo, afastado do teatro há algum tempo, quando lí a notícia pela internet.
- Droga, o Plínio Marcos morreu!
- Quem morreu, Emilio? Me perguntou o meu chefe.
- O Plínio Marcos. Um escritor de teatro.
- Puxa, que pena! Disse o meu chefe, com uma indiferença que chegou a me chocar. Afinal, não era qualquer um que tinha morrido. Foi o Plínio! Meu chefe voltou a passar por minha sala e, ao me ver chorando, quieto, no meu canto, comentou:
- Era seu amigo? Me desculpe, eu não sabia.
- Não tem importância! Não tem mais importância! Respondi, quieto e envergonhado por estar tão distante do teatro, naquela época. Li, na notícia, que ele já andava doente há algum tempo; e eu nem sabia.
Fiquei ali, naquele final de tarde, pensando naquele garoto que o Plínio subvertera, e despertou para as suas lutas cotidianas, contra o embrutecimento do homem. Não demorou nem um ano, e eu saí do emprego e voltei a me envolver novamente com o teatro. Não era mais o mesmo, mas estava de volta. Não voltei por causa do Plínio, é claro. Voltei porque precisava voltar a respirar. Voltei porque aquela parte macia, existente no coração embrutecido de cada homem, da qual o Plínio sempre falava, voltou a incomodar.
Fico imaginando como o Plínio estaria, agora, aos oitenta anos. Em quantas pessoas ainda estaria subvertendo. Hoje, mais do que nunca, ele faz falta!
Eu o conheci quando ainda era adolescente. Ele foi na minha escola, apresentar “Quando as máquinas param”, um dos seus vários sucessos. Ao final, realizou um debate conosco. Me lembro que ri muito, e chorei. Ele fez o que queria com a nossa emoção. Tinha domínio sobre o público. Me emocionei com aquele baixinho invocado, desbocado e carismático.
No final ele nos disse: - Se eu conseguir sair daqui, hoje, tendo subvertido algum de vocês, já terei cumprido minha missão!
Saí subvertido! Aquela inquietação bateu em mim, me identifiquei.
Pouco depois, por diversas razões, e inspirado também por outras pessoas, comecei a estudar teatro. Comecei a frequentar a livraria do INACEN, que funcionava no Teatro de Arena. Cansei de encontrá-lo por lá. A Beth, que atendia a livraria, guardava sempre as coisas dele.
Nós também nos encontrávamos, vez ou outra, na porta dos teatros, onde ele vendia seus livros, e vinha sempre com o mesmo argumento:
- Compra meu livro que eu te dou um autógrafo, e prometo morrer logo, para valorizar.
- Plínio, tu autografa todos os teus livros. Daqui a pouco, raridade será ter um livro teu que não tenha autógrafo!
Ele, que era rápido de raciocínio, rebateu “na lata”: - Sabe que tu tens razão! Vou passar a cobrar mais pelos livros sem autógrafo.
Em 1985, teve o projeto "Balanço Geral", no Teatro Maria Della Costa, onde foram feitas leituras dramáticas dos principais espetáculos censurados nas últimas décadas. Após as leituras, eram feitos debates e, quando possível, reuniam o elenco original, para dar seu depoimento sobre esta época, em que a censura era ferrenha e atacava o teatro com tudo.
Fui em quase todas essas leituras e, no dia em que leram a "Feira Paulista de Opinião", que apresentava algumas peças curtas dos autores mais polêmicos da época, eu estava na plateia. Uma das peças apresentadas era do Plínio, e ele colocou um gorila, em cena, vestido de militar. Essa cena foi muito comentada durante o debate. Me lembro que, no instante em que o ator Renato Consorte (que havia interpretado o gorila) estava dando o seu depoimento, alguém chegou com a notícia de que o Plínio tinha sofrido um enfarte. O teatro, imediatamente, esvaziou. Todos, preocupados, foram para o hospital, prestar sua solidariedade à família, e ajudar como podiam. Plínio era muito querido por todos. A classe teatral o amava e admirava. E as preces dos amigos foram atendidas. Ele escapou desta.
Em 1999, ele se foi. Me lembro que, nesta época, estava trabalhando como executivo, afastado do teatro há algum tempo, quando lí a notícia pela internet.
- Droga, o Plínio Marcos morreu!
- Quem morreu, Emilio? Me perguntou o meu chefe.
- O Plínio Marcos. Um escritor de teatro.
- Puxa, que pena! Disse o meu chefe, com uma indiferença que chegou a me chocar. Afinal, não era qualquer um que tinha morrido. Foi o Plínio! Meu chefe voltou a passar por minha sala e, ao me ver chorando, quieto, no meu canto, comentou:
- Era seu amigo? Me desculpe, eu não sabia.
- Não tem importância! Não tem mais importância! Respondi, quieto e envergonhado por estar tão distante do teatro, naquela época. Li, na notícia, que ele já andava doente há algum tempo; e eu nem sabia.
Fiquei ali, naquele final de tarde, pensando naquele garoto que o Plínio subvertera, e despertou para as suas lutas cotidianas, contra o embrutecimento do homem. Não demorou nem um ano, e eu saí do emprego e voltei a me envolver novamente com o teatro. Não era mais o mesmo, mas estava de volta. Não voltei por causa do Plínio, é claro. Voltei porque precisava voltar a respirar. Voltei porque aquela parte macia, existente no coração embrutecido de cada homem, da qual o Plínio sempre falava, voltou a incomodar.
Fico imaginando como o Plínio estaria, agora, aos oitenta anos. Em quantas pessoas ainda estaria subvertendo. Hoje, mais do que nunca, ele faz falta!
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