Em uma época onde as pessoas formam
clubes, diversas tribos, e julgam que suas facções são as únicas que possuem a
verdade absoluta; onde as pessoas discriminam uma às outras por discordarem de
seus paradigmas, acho fundamental postar o discurso de Krishnamurti, ao
dissolver a Ordem da Estrela, em 1929. Antes, porém, é necessário conhecer mais
sobre este que, um dia, foi considerado pelo Teosofistas, como um dos futuros
Mestres do Mundo.
Jiddu Krishnamurti (telugu: జిడ్డు కృష్ణ మూర్తి) (Madanapalle, 11 de maio de 1895 — Ojai,
17 de fevereiro de 1986) foi um filósofo, escritor, e educador indiano.
Proferiu discursos que envolveram temas como revolução psicológica, meditação,
conhecimento, liberdade, relações humanas, a natureza da mente, a origem do
pensamento e a realização de mudanças positivas na sociedade global.
Com a idade de treze anos, passou a ser
educado pela Sociedade Teosófica, que o considerava um dos grandes Mestres do
mundo. Em Adyar, Krishnamurti, foi 'descoberto' por Charles W. Leadbeater,
famoso membro da Sociedade Teosófica (ST), em abril de 1909, que, após diversos
encontros com o menino, viu que ele estava talhado para se tornar o 'Instrutor
do Mundo', acontecimento que vinha sendo aguardado pelos teosofistas. Após dois
anos, em 1911 foi fundada a Ordem Internacional da Estrela do Oriente, com
Krishnamurti como chefe, que tinha como objetivo reunir aqueles que acreditavam
nesse acontecimento e preparar a opinião pública para o seu aparecimento, com a
doação de diversas propriedades e somas em dinheiro. Em 3 de agosto de 1929,
dia da abertura do Acampamento Anual da Estrela, em Ommen, Holanda,
Krishnamurti dissolveu a Ordem diante de 3.000 membros, alegando que nenhuma
instituição pode nos levar mais próximos da verdade. Abaixo está o texto
completo da palestra que ele deu naquela ocasião.
A VERDADE É UMA TERRA SEM CAMINHOS
(O discurso da Dissolução)
(O discurso da Dissolução)
Jiddu Krishnamurti
O Acampamento de Ommen em 1929 iniciou
seus trabalhos no dia 2 de agosto numa atmosfera de tensão e expectativa, quando
a maioria das pessoas ali presentes compreendia o que ia acontecer. Na manhã seguinte,
em presença da Sra. Besant, de mais de três mil membros da Estrela, e com
muitos milhares de holandeses ouvindo pelo rádio, Krishnamurti fez o discurso
em que dissolveu a Ordem da Estrela:
“Vamos discutir hoje a dissolução da Ordem
da Estrela. Muitos ficarão encantados, tristes. Não se trata, porém, de uma
questão de regozijo nem tristeza, porque é inevitável, como passarei
explicar...
Sustento que a Verdade é uma terra sem
caminhos, e vós não podeis aproximar-vos dela por nenhum caminho, por nenhuma
seita. Esse é o meu ponto de vista e eu o sigo de modo absoluto e
incondicional. Não tendo limites, não sendo condicionada e não sendo acessível por
nenhuma espécie de caminho, a Verdade não pode ser organizada; nem se deve
formar nenhuma organização para levar ou forçar as pessoas a enveredar por
determinado caminho. Se compreendeis isso em primeiro lugar, vereis que é
impossível organizar a crença. A crença é uma questão puramente individual, e
não podeis nem deveis organizá-la.
Se o fizerdes, ela morrerá cristalizar-se-á;
tornar-se-á um credo, uma seita, uma religião, para ser imposta a outros. Isso
é o que toda a gente, no mundo inteiro, está tentando fazer. Acanha-se a
Verdade e transforma-se em brinquedo para os fracos, para os momentaneamente
insatisfeitos. A Verdade não pode ser trazida cá para baixo, o indivíduo é que
deve fazer um esforço para subir até ele. Não podeis trazer o topo da montanha
ao vale...
Portanto, esta é a primeira razão, do meu
ponto de vista, pela qual a Ordem da Estrela deve ser dissolvida. Apesar disso,
formareis provavelmente outras Ordens, continuareis a pertencer a outras
organizações à procura da Verdade. Não quero pertencer a nenhuma organização
espiritual; compreendei-me isso, por favor...
Se se criar uma organização com esse propósito,
ela se tornará uma muleta, uma fraqueza, uma servidão, estropiará o indivíduo e
o impedirá de crescer, de firmar sua unicidade, que reside no descobrimento,
para si mesmo, da Verdade absoluta, não condicionada. Portanto, essa é outra
razão que me leva, como chefe da Ordem, a querer dissolvê-la.
Não se trata de um feito magnífico, porque
não quero seguidores, e estou falando sério. A partir do momento em que
seguirdes alguém deixareis de seguir a Verdade. Não me preocupa saber se
prestais ou não atenção ao que digo. Quero fazer certa coisa no mundo e vou
fazê-la com pertinaz concentração. Só me preocupa uma coisa essencial: libertar
o homem. Desejo libertá-lo de todas as gaiolas, de todos os temores, e não
fundar religiões, novas seitas, nem estabelecer novas teorias e novas
filosofias. Diante disso, perguntar-me eis, naturalmente, por que percorro o
mundo todo, falando sem parar. Eu vos direi por que o faço; não o faço por
desejar um séquito, não o faço por almejar um grupo especial de discípulos
especiais. (Os homens gostam de ser diferentes dos seus semelhantes, por mais ridículas,
absurdas e triviais que possam ser as distinções! Não quero estimular essa absurdeza.)
Não tenho discípulos, nem apóstolos, nem na terra nem no reino da espiritualidade.
Tampouco me atrai o fascínio do dinheiro
ou o desejo de levar urna vida confortável. Se eu quisesse levar uma vida
confortável, não viria a um Acampamento nem viveria num país úmido! Estou
falando com franqueza porque pretendo deixar isto resolvido de uma vez por todas.
Não quero saber dessas discussões infantis ano após ano. Um repórter de jornal,
que me entrevistou, considerou um ato magnífico dissolver uma organização que
possuía milhares e milhares de membros. No seu entender foi um grande ato
porque ele disse: "Que fará o senhor depois disso? Como viverá? Não terá
quem o siga, ninguém mais lhe dará atenção.” Bastará que haja cinco pessoas
desejosas de prestar atenção, desejosas de viver, com o rosto voltado para a
eternidade! Que adianta ter milhares que não compreendem, que estão totalmente
embalsamados em preconceitos, que só querem o novo para traduzi-lo e, assim,
adequá-lo aos seus próprios egos estéreis e estagnados?...
Porque sou livre, não condicionado, total,
não a parte, não o relativo, mas a Verdade total, que é eterna, desejo que os
que procuram compreender-me sejam livres, não me sigam, não façam de mim a
gaiola que se converterá em religião, em Seita. Desejo que sejam livres de
todos os medos – do medo da religião, do medo da salvação, do medo da
espiritualidade,
do medo do amor, do medo da morte, do medo
da própria vida. Assim como o
artista pinta um quadro por encontrar
deleite na pintura, por ser ela a expressão de si mesmo, sua glória, seu
bem-estar, assim não faço isto por desejar alguma coisa de alguém. Estais
acostumados à autoridade, ou à atmosfera da autoridade que, cuidais, vos levará
à espiritualidade. Pensais e esperais que outra pessoa, por seus poderes
extraordinários – um milagre – possa transportar-vos ao reino da liberdade
eterna que é a Felicidade. Toda avossa maneira de encarar a vida se baseia
nessa autoridade.Faz hoje três anos que me ouvis, sem que
nenhuma alteração se tenha verificado, a não ser em poucos. Analisai agora o
que estou dizendo, sede críticos, para poderdes compreender cabalmente,
fundamentalmente...
Há dezoito anos que vos preparais para
este acontecimento, para o Advento do Mestre Universal. Durante dezoito anos
organizastes alguém capaz de proporcionar um novo deleite aos vossos corações e
às vossas mentes, de transformar a vossa vida, de dar-vos uma nova compreensão;
alguém que vos elevasse a um novo plano de vida, que vos desse um novo
incentivo, que vos libertasse – e vede agora o que está acontecendo!
Considerai, raciocinai e descobri como foi que essa crença vos tornou
diferentes – não com a diferença
superficial do uso de uma insígnia, que e'
trivial, absurda. Como foi que essa crença varreu para longe todas as coisas
não essenciais da vida? Esta é a única maneira de julgar: como foi que vos
tornastes mais livres, maiores, mais perigosos para toda sociedade que se baseia
no falso e no não essencial? Como foi que se tornaram diferentes os membros
desta organização da Estrela?...
Todos dependeis, para a vossa
espiritualidade, de outra pessoa; para a vossa felicidade, de outra pessoa;
para a vossa iluminação, de outra pessoa... Quando digo buscai dentro de vós a
iluminação, a glória, a purificação e a incorruptibilidade do ego, nenhum de vós
se dispõe a fazê-lo. Talvez haja uns poucos, mas são muito, muito poucos. Assim
sendo, por que ter uma organização?... Nenhum homem de fora pode libertar-vos;
nem o culto organizado, nem a vossa imolação por uma causa poderão
libertar-vos; como também não poderá libertar-vos o ingresso numa organização,
o envolvimento no trabalho. Usais uma máquina de escrever para redigir cartas,
porém não a colocais num altar e não a adorais. Mas é isso o que fazeis quando
as organizações passam a ser vossa principal preocupação. "Quantos membros
há nela?" É a primeira pergunta que me formulam todos os repórteres de
jornais. "Quantos seguidores tem o senhor? Pelo número deles julgaremos se
o que diz é' verdadeiro ou falso." Não sei quantos há. Não me preocupo com
isso. Se houvesse apenas um homem que se tivesse libertado, este já seria o
suficiente.
Além disso, tendes a ideia de que somente
certas pessoas tem a chave do Reino da Felicidade. Ninguém a tem. Ninguém tem
autoridade para trazê-la consigo. Essa chave é o vosso eu, e só no
desenvolvimento, na purificação e na incorruptibilidade desse eu se encontra o
Reino da Eternidade...
Estais acostumados a que vos digam até
onde chegou o vosso progresso, qual o vosso status espiritual. Quanta
infantilidade! Quem, se não vós mesmos, podeis dizer se sois ou não
incorruptíveis?...
Mas os que realmente desejam compreender,
que estão buscando o eterno, o sem começo e sem fim, caminharão juntos com
maior intensidade, serão um perigo para tudo o que não é essencial, as
irrealidades e as sombras. E eles se concentrarão, tornar-se-ão a chama, porque
compreendem. Tal é o corpo que precisamos criar e tal é o meu propósito. Por causa
dessa amizade verdadeira – que pareceis não conhecer – haverá uma cooperação verdadeira
da parte de cada um. Não em virtude da autoridade, não em virtude da salvação, mas
porque compreendeis realmente e, portanto, sois capazes de viver no eterno.
Isto, sim, é maior do que todo o prazer, do que todo o sacrifício.
Eis aí, portanto, algumas das razões por
que, depois de dois anos de cuidadosaconsideração, tomei essa decisão. Ela não
partiu de um impulso momentâneo. Ninguém me persuadiu a tomá-la – ninguém me
persuade a fazer essas coisas. Por dois anos venho pensando nisso, lenta,
cuidadosa, pacientemente, e agora decidi dissolver a Ordem, visto que sou o
Chefe. Podereis formar outras organizações e esperar outra pessoa. Isso não me interessa,
como também não me interessa a criação de novas gaiolas e novas decorações para
as gaiolas. Minha preocupação é formar homens absoluta e incondicionalmente
livres.
Nenhum comentário:
Postar um comentário